Entrevista do professor e cientista da computação Diego Aranha, concedida à Revista IstoÉ , onde reafirma os prejuízos para a democracia brasileira gerados pelo Sistema Eleitoral, sua falta de transparência e os riscos de fraudes, inclusive internamente, no próprio quadro de servidores do TSE.
As urnas são seguras mesmo?
Especialistas em informática driblam sistema de segurança da votação eletrônica e dizem que a eleição não está imune a violações
Há anos os brasileiros depositam suas expectativas políticas em urnas eletrônicas. O sistema se notabilizou principalmente pela agilidade na apuração e pela garantia, por parte do Tribunal Superior Eleitoral, de que é imune a violações. Se a velocidade do trabalho de contagem dos votos é indiscutível, a segurança das urnas nunca foi unanimidade. Neste ano, a preocupação ganhou força depois que um grupo de especialistas em informática descobriu falhas graves na proteção do software utilizado nas urnas. A ação desses “hackers” fez parte de um teste público realizado no TSE. Em vez de ajudar a aperfeiçoar a votação eletrônica, a iniciativa acabou reforçando a impressão de que o processo eleitoral precisa evoluir e se tornar mais transparente.
Em entrevista à ISTOÉ, o responsável pela equipe que conseguiu violar a urna eletrônica de teste, o professor Diego Aranha, da Universidade de Brasília, disse que foi pressionado para não divulgar a íntegra do relatório ¹ em que apontou as falhas de segurança do programa desenvolvido pelo TSE.
“Apenas a versão aprovada pelo Tribunal foi publicada. As informações sensíveis foram suprimidas.” diz Aranha.
NÃO SÃO SEGURAS
“As falhas existem. As urnas não são 100% seguras como dizem”
Doutor em ciências da computação pela Unicamp e especializado em Segurança e Criptografia, Aranha decidiu arriscar sua reputação, convicto das vulnerabilidades da urna eletrônica. “Elas existem e nós demonstramos isso. As urnas não são 100% seguras como dizem.”
Quase seis meses depois do início dos testes, em março, o pesquisador resolveu publicar um relatório independente no qual aponta uma série de fragilidades do processo eleitoral.
“O software utilizado no sistema de votação eletrônica brasileiro não satisfaz requisitos mínimos de segurança e transparência”.
Entre as principais falhas, estariam a proteção inadequada do sigilo do voto, que permitiria saber em qual candidato determinado eleitor votou, o uso de apenas uma única chave criptográfica para cifrar as mídias de todas as urnas eletrônicas do País e a aplicação de algoritmos obsoletos cujo uso para segurança em computação já não é recomendado há pelo menos seis anos.
“Seria o mesmo que proteger milhares de urnas que serão usadas na eleição com cadeados que podem ser abertos pela mesma chave e ainda esconder essa chave debaixo do tapete, o lugar mais óbvio.”
A equipe de informática do TSE é formada por cerca de 150 servidores públicos da área de tecnologia da informação e metade desse quadro é responsável pelo desenvolvimento do sistema eleitoral.
“Nossa democracia está sob controle absoluto de 70 pessoas e o TSE parte do princípio de que esses funcionários são absolutamente incorruptíveis”, afirma o professor.

“Nossa democracia está sob controle absoluto de 70 pessoas no TSE.” Diego Aranha
No país da Lava Jato, seriam esses funcionários incorruptíveis?
O secretário de Tecnologia da informação do Tribunal Giuseppe Janino,² rebate as críticas. “Nos anos de uso do sistema automatizado, não houve sequer um caso de fraude ou tentativa registrada”, ³ afirma Janino. Sobre suspeitas já levantadas em outros pleitos, ele diz que todas foram “devidamente apuradas”. Uma delas se deu na disputa pelo governo do Maranhão, em 2010. Roseana Sarney decidiu a eleição no primeiro turno por uma margem de 0,08% (ela obteve 50,08% dos votos).
Candidato pelo PCdoB, Flávio Dino questionou a vitória no Tribunal Regional Eleitoral maranhense. Em relatório, ele indicou falhas nos arquivos de auditoria das urnas e a ocorrência incomum de votos “rápidos e tardios”, conforme descrito na denúncia. O caso, porém, foi arquivado pelo TRE.
Professor da Universidade Federal de Pernambuco e um dos criadores do polo tecnológico Porto Digital, Sílvio Meira defende maior transparência por parte do TSE, que planeja, executa e fiscaliza as eleições, além de julgar os processos.
NT: ¹ Relatórios do Prof. Diego podem ser conferidos aqui.
NT: ² Giuseppe Janino é alvo de Notícia Crime na PF, por mentir na CPI de Crimes Cibernéticos. A denúncia foi apresentada pela Coalizão Convergências, que reúne centenas de Movimentos Civís, juristas, advogados, jornalistas. Ele e o Diretor Geral da Secretaria do TSE, Maurício Caldas de Melo, também foram alvos de pedido de exoneração por Associação de Juízes.
NT: ³ Milhares de denúncias de fraudes abundam no Brasil a cada eleição há muitos anos, porém, nunca são “devidamente apuradas”, justamente porque o sistema é inauditável, sem um registro físico que possa espelhar o resultado digital, e, qualquer fraudador – inclusive interno do órgão, como disse Aranha -, pode apagar os rastros da fraude. Alguns relatos por especialistas, podem ser vistos no livro FRAUDES E DEFESAS.